Ventura quer dar "murro na mesa" e Gouveia e Melo afirma-se ao centro para "unir Portugal"

No frente-a-frente na RTP, o líder do Chega acusou o almirante de querer "agradar a toda a gente" e este garantiu que sempre se posicionou ao centro.

Joana Raposo Santos, Graça Andrade Ramos - RTP /
Foto: Francisco Romão Pereira - RTP

André Ventura e Henrique Gouveia e Melo debateram esta segunda-feira na RTP. O candidato apoiado pelo Chega afirmou que quer "dar um murro na mesa no sistema político", enquanto o almirante reiterou que sempre foi de centro, tendo por objetivo "unir Portugal".

“Temos de dar um murro na mesa no sistema político em Portugal”, frisou André Ventura. “Quero ser um condutor do país e dizer ao país que temos de ir por outro caminho e não pelo caminho destes erros, destes conluios, desta corrupção que temos tido há 50 anos”.

Referindo-se a uma sondagem da Católica para a RTP, Antena 1 e Público conhecida esta segunda-feira que o colocou à frente nas intenções diretas de voto, o candidato do Chega agradeceu aos eleitores que o elegeram apesar das tentativas de o “silenciar”.

A mesma sondagem indica, porém, que numa segunda volta André Ventura sairia sempre a perder, independentemente do adversário.

“Vamos ter provavelmente duas voltas” e na segunda “temos uma coisa curiosa, que é: provavelmente todos se vão unir contra mim e contra esta candidatura”, disse o candidato no debate desta noite.

Questionado sobre se vai procurar um discurso que encontre outro eleitorado numa segunda volta, Ventura rejeitou.

“O meu discurso é Portugal. O meu discurso é dar um murro na mesa do sistema. Eu não vou mudar isso a partir do dia 18 de janeiro”, garantiu. “Eu não troco convicções por votos”.
Gouveia e Melo garante ser de centro, Ventura acusa-o de querer "agradar a toda a gente"
Também questionado sobre a sondagem da Católica, que o coloca em terceiro lugar nas intenções diretas de voto, Henrique Gouveia e Melo relembrou que “já houve sondagens que falharam a três, quatro dias das eleições e falharam redondamente”.

“De facto eu estou numa luta partidária (…) em que todos os partidos têm os seus candidatos e, naturalmente, tentam atrair os votos do partido. Eu sou o único que não tem partido. Diria que o meu partido é Portugal”, reiterou o almirante.

“Estou preocupado basicamente é com o futuro de Portugal. Se os portugueses me escolherem é isso que eu tentarei fazer: unir verdadeiramente Portugal”, explicou.

O candidato quer fazê-lo por acreditar que “vamos viver tempos verdadeiramente difíceis”, nomeadamente devido à “situação internacional muito preocupante” ou ao “fruto da instabilidade dentro do próprio sistema político”.

“Eu sempre fui de centro”, assegurou ainda. “Quem está de direita acha que quem está ao centro é à esquerda. E quem está à esquerda acha que quem está ao centro está à direita”. O líder do Chega acredita que “Gouveia e Melo quer agradar a toda a gente e não agrada a ninguém”.

Ventura disse acreditar que Gouveia e Melo tem mostrado, ao longo da campanha presidencial, não ser “apartidário”, já que “juntou quase toda a estrutura do Partido Socialista” e “disse mesmo que Mário Soares era a sua referência de presidente da República”.

O almirante respondeu que, quando falou de Mário Soares, falou de Ramalho Eanes “ao mesmo tempo” para dizer que “são referências do início da nossa democracia” e que “sem eles se calhar teríamos um regime comunista, de extrema-esquerda, e se calhar o doutor André Ventura não poderia estar aqui”.
Imigração afasta líder do Chega do almirante
O jornalista Carlos Daniel abordou também o almoço entre estes dois candidatos. "Também já me encontrei com outros candidatos à Presidência da República", como Marques Mendes e António José Seguro, atirou André Ventura, para quem isso é natural.

Voltando a referir que na sua "perspetiva" Gouveia e Melo "começou a querer ser o candidato do Partido Socialista", André Ventura admitiu que o almirante se tornou mais forte "porque é o candidato do Partido Socialista", levando o adversário a rir-se.

António José Seguro, o candidato oficialmente apoiado pelo PS, "não estaria com nove por cento, ou dez ou 12, se fosse o candidato do Partido Socialista a sério", disse Ventura. "A verdade é que o PS tem dois candidatos", acusou. O almirante rejeitou depois a afirmação, esclarecendo "não sou o candidato do PS, sou candidato do partido Portugal".

Admitindo que Gouveia e Melo foi "uma possibilidade" para ser o candidato do Chega, mas que acabou por se revelar "não ser a correta", André Ventura acrescentou que "face àquilo que foi dito, eu não apoiaria o candidato Gouveia e Melo", sublinhando que as sondagens lhe "dão razão".

Ventura apontou aquilo que o afasta das posições do almirante face à imigração, segurança, habitação, saúde, referindo que "percebi que os portugueses queriam outra coisa que não era o almirante Gouveia e Melo".

O líder do Chega referiu-se a si mesmo como "dos políticos mais combativos de Portugal" para acrescentar que os portugueses querem que os políticos encontrem soluções, sendo por isso que "têm de falar", justificando assim o almoço que teve com Gouveia e Melo.

Gouveia e Melo contradisse Ventura, ao afirmar que "sempre fui a favor do controlo da imigração" e, "numa diferença" face ao rival, "a favor da integração" dos imigrantes, para "aumentar não só o seu potencial económico mas também a estabilidade social".

O almirante reconheceu que o país teve uma imigração desregulada que fez com que o número de imigrantes tornasse impossível a sua integração, acrescentando que isso "é um problema" para Portugal.
Chumbo da Lei da Nacionalidade condenado por Ventura e apoiado pelo almirante
O chumbo da Lei da Nacionalidade pelo Tribunal Constitucional, esta segunda-feira, defendida pelo Chega, foi outro dos temas do debate, levando André Ventura a dizer que "hoje quem foi derrotado não foi o André Ventura, foi o país que foi derrotado".

O candidato do Chega indignou-se por ser impossível "retirar a nacionalidade a quem a obteve e que comete crimes como violação, ou até um golpe de Estado". "Disparate absoluto, um erro daqueles que vamos pagar caro", vaticinou.

André Ventura apontou também a obtenção fraudulenta da nacionalidade, questionando porque não poderá ser perdida neste caso, apesar da atual lei já punir estes casos. "Quem vem para Portugal tem de cumprir as nossas regras", defendeu, afirmando ter de se acabar com a "conversa de chacha" e que quem não cumpre só tem dois caminhos, "ou a prisão ou a expulsão".

Ventura criticou ainda "quem vem para cá viver se subsídios", referindo que, ao contrário de outros estados europeus, como a Alemanha, "nós não somos ricos". "Há um ponto em que tem de se dizer chega", afirmou, denunciando quem ofenda os símbolos nacionais, como a bandeira ou o hino de Portugal.

"Temos de deixar de ser politicamente corretos nisto", acrescentou frisando que, ao contrário do que ouviu o adversário afirmar, "um imigrante em Portugal ao fim de dez anos não é português".

Gouveia e Melo recordou que "as leis deste país não podem desrespeitar a Constituição", lembrando especificamente o artigo 13.º, que define que todos os portugueses são iguais perante a lei.

Desde o momento em que atribuímos a nacionalidade a um estrangeiro, ele "passa a ser português", referiu, estando por isso abrangido pelo artigo 13 e esclarecendo que "foi isso basicamente que foi dito pelo Tribunal Constitucional".

O almirante referiu que concorda com a decisão, "porque se não, haveria portugueses de primeira, de segunda, de terceira, quarta e quinta categoria". "Não de pode candidatar a presidente da República", atirou André Ventura com ironia.

Sem perder o fio do raciocínio, Gouveia e Melo sublinhou que, ao fim de dez anos, "a pessoa está em condições de pedir a nacionalidade", mas se, nesse período, "andou a cuspir na bandeira, andou a cometer crimes, etc, não terá certamente acesso à nacionalidade".

O almirante reconheceu que a lei da nacionalidade "tem de ser clarificada" quanto ao "processo para todos os envolvidos", até pelas expetativas que criou, "positivas e negativas", até junto dos imigrantes. E, apesar de a considerar "urgente", sublinhou que não pode contrariar a Constituição.

Gouveia e Melo acrescentou que o chumbo se deveu a uma parte da lei, que irá ser revista pelos partidos que a apoiaram em sede da Assembleia da República, que irão depois voltar a apresentá-la "rapidamente" ao TC, desfazendo a polémica.

"O meu adversário quer agradar em tudo a toda a gente", criticou André Ventura, acusando Gouveia e Melo de não ter esclarecido se é a favor ou não da lei da nacionalidade e em quê. 

"Temos de ter uma lei da nacionalidade porque a nossa nacionalidade está à venda nos mercados da Índia e do Bangladesh", afirmou, sendo de imediato contrariado e lembrado de que não são estas as nacionalidades que estão à frente nos registos de imigração, que são liderados por Israel "que a compram muitas vezes", atirou Gouveia e Melo.

"Eu sou contra a compra da nacionalidade!" respondeu André Ventura, com o rival a retorquir "ah, então estamos do mesmo lado!", num dos momentos mais acesos do debate, com Ventura a negar que estejam de acordo.

"Essa é a diferença entre nós, é que eu digo ao que venho", exclamou Ventura, "eu quero impedir que a nossa nacionalidade ande à venda".

Desafiando o adversário a dizer o que pensa sobre a proposta de lei da nacionalidade, o líder do Chega perguntou diretamente ao almirante se este concorda com a perda de nacionalidade em caso de crime de violação. "Não concordo", esclareceu Gouveia e Melo. "Pronto, devia ter começado por aí", atirou Ventura.

Gouveia e Melo esclareceu que, se "um português" cometer tal crime "não perde a nacionalidade". "Não é a mesma coisa", questionou o rival.
Ambos aceitam alterar a Constituição
O almirante admitiu que a Assembleia pode decidir que "em caso nenhum se concede a nacionalidade". "Não quero isso", contrariou de imediato o líder do Chega.

Perante sucessivos exemplos referidos por Ventura de outros países em que a lei retira a nacionalidade em casos de crimes, Gouveia e Melo admitiu "temos de mudar a Constituição".

"Ah", saltou Ventura, "estamos de acordo com isso!".

Perante a perspetiva de jurar uma Constituição com a qual discorda tanto, André Ventura lembrou que é deputado e que "estou a cumprir a Constituição". Enquanto presidente "posso mobilizar o país" para alterar a Constituição, referiu.

"Eu não estou preso a um documento, eu quero servir o povo português", dando como exemplos de alteração a "castração química de pedófilos" e recordando o caso recente de um adjunto de uma ex-ministra da Justiça, "um socialista".

André Ventura deu outro exemplo, em que apoiantes de Gouveia e Melo referiram em manifesto pretender controlar as nomeações na Justiça, com o adversário a frisar que não subscreveu o documento, denunciando tais ideias.

O líder do Chega não vê qualquer problema em jurar uma Constituição que quer alterar. "A nossa Constituição é alguma Bíblia?" questionou. "Se é má para o povo português, temos de a mudar".

Gouveia e Melo afirmou que "só há um artigo que eu acho que não podemos mudar na Constituição, que é o 288", referente aos limites da lei fundamental, admitindo que todos os outros podem ser alterados em sede da Assembleia da República.

"Portugal, só unido é que consegue vencer os desafios que vêm pela frente", defendeu. "A Presidência é aquele lugar que ajuda a unir Portugal", acrescentou, evocando o "poder de influência" de um presidente para levar a mudanças no país, em resposta aos problemas como a emigração de jovens, ou o apoio à terceira idade.

"Portugal não pode viver de ódios e de ódios internos", acrescentou numa farpa a André Ventura, conhecido pelo seu discurso divisivo.

Gouveia e Melo esclareceu ainda que "estava disposto a rever a Constituição desde que isso não signifique a rotura com o sistema democrático" expressa no artigo 288, ao que André Ventura anuiu. "A solução consensual é a melhor solução", defendeu ainda o almirante.

"Se os partidos da direita tiverem a maioria e quiserem mudar a Constituição, desde que não mexam verdadeiramente na base ideológica da Constituição que está no 288, estarei disponível como qualquer presidente, acho, deverá estar disponível".
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